terça-feira, 10 de maio de 2011

RELIGIÃO CRISTÃ E CIÊNCIA

Quando me refiro à religião cristã, falo das tradições religiosas históricas que envolvem a idéia de cristianismo, isto é, o catolicismo romano, os ortodoxos e o protestantismo. As influências de pensadores europeus e americanos nas estruturas de pensamento religioso sob a ótica cristã tem sido bastante perceptível quando se fala em reinterpretar as escrituras considerando as descobertas (?) cientificas.
Poderíamos apontar dentro da teologia variadas formas de reinterpretação na tentativa de conciliar os relatos bíblicos sobre determinados fatos (a criação, por exemplo) com as afirmações presentes nas ciências humanas e da natureza. Assim, na teologia cristã histórica ou mais precisamente nas idéias de pensadores cristãos. Temos como exemplo do que relatamos agora os modelos do tipo “criacionismo intermediário” e o “criacionismo fundamentalista cientifico”.
No criacionismo intermediário está precisamente contida a idéia de união entre pensamento religioso com as ciências. Apresenta um conteúdo fortemente filosófico e cientifico considerando aspectos éticos ou elementos divinos que não entrem em choque com as ciências. A questão de dogmas pode ser relativizada ou flexibilizada de acordo com as conveniências. Um exemplo clássico dessa reinterpretação teológica se aplica à questão do dilúvio (universal ou local?).
O criacionismo fundamentalista cientifico procura resgatar a ortodoxia religiosa unindo os relatos bíblicos às descobertas cientificas colocando essas descobertas abaixo dos relatos bíblicos. Nesse caso, por exemplo, tenta validar a idéia de uma terra jovem com base nos métodos de datação utilizados pelas ciências.
Aqueles que têm poucas objeções à teoria da evolução ou mesmo não tendo qualquer objeção a essa teoria e que, no entanto mantém sua crença de que por trás da ordem existente no universo está uma mente inteligente, um ser sobrenatural, são chamados de evolucionistas teistas. Também deve ser dito aqui que o criacionismo puro, aquela forma de interpretação biblica sem qualquer pretensão cientifica permanece ativo nas mentes das pessoas é a tradição religiosa que se impõe ou as verdades da fé judaico-cristãs na sua forma mais primitivas.
Postado por DAVID LIMA 1975

RELIGIÃO E TEOLOGIA

Num primeiro momento, observando o titulo acima, pode-se perceber que há a pretensão de caracterizar cada uma das expressões desse titulo, ou talvez muitos considerem um e outro como a mesma coisa. Naturalmente religião envolve teologia(s) e teologia envolve religião(ões), porém, tentaremos diferenciar a religião ou as ciências da religião da teologia.
Teologia aborda um campo especifico de estudo dentro de uma tradição religiosa. Desse modo podemos falar de teologia cristã e de teologias especificas na tradição cristã como a teologia católica romana, a teologia ortodoxa ou a teologia protestante. Poderíamos ainda ser mais específicos mencionando particularidades inclusas nessas teologias como a teologia da libertação, a teologia neo-ortodoxa, a teologia liberal, a teologia existencial, a teologia reformada, a teologia pentecostal ou neopentecostal. Podemos também fazer referência à teologia umbandista, à teologia budista, taoista, xintoísta, islâmica, judaica ou hindu.
Se falarmos em ciências da religião, teremos um alcance mais abrangente. Não seremos tão específicos na tentativa de compreender esta ou aquela teologia, mas, as teologias das religiões, sua história, seus símbolos e outros aspectos como um único objeto de estudo. Faríamos o estudo cientifico do fenômeno religioso enquanto característica do homem desde os tempos mais remotos até o presente. Analisaríamos a religião sob a ótica filosófica, sociológica, histórica e psicológica abordando questões como a tradição, a sociedade sob influência da religião, o conjunto de costumes, a cosmologia dos diferentes grupos religiosos ou a cosmovisão, os conflitos resultantes, e é claro, as perspectivas do fato religioso.
De uma outra maneira poderíamos encarar a religião como fator de ligação ou religação a algo ou alguém, assim temos a religião com uma visão de passado, presente e futuro. As religiões encaram essa religação como um fato subjetivo (pessoal) que pode ser inclusivista (geral) ou exclusivista (restrito). Usando como exemplo o cristianismo, pode-se perceber sua tendência exclusivista, isto é, a idéia de salvação ou sua possibilidade só ocorre dentro do cristianismo. Porém, essa é a opinião da maioria dos que se declaram cristãos e não da totalidade.
Essa reflexão aqui, obviamente, não tem a pretensão de um alcance extenso, rigoroso em metodologia, apenas um esclarecimento útil aos iniciantes desse estudo. Sou um profundo apaixonado pelo estudo da religião. Ela envolve fatores que são de grande inquietação aos seres humanos como, por exemplo, a questão das origens e dos acontecimentos finais, escatologicamente falando. Nossas mentes são limitadas nessa tentativa de compreensão, no entanto, considero um trabalho gratificante e apaixonante se atentarmos para a idéia de mudanças de estruturas da sociedade, de renovação, de reflexão a respeito de questões que envolvem a todos. Não tenho a intenção de dizer o que é a verdade religiosa aqui, pois para isso seriam levantadas muitas afirmações e contra-afirmações e provavelmente cairíamos no relativismo que é tão atraente às pessoas, mas, o estudo do fenômeno religioso é indispensável se pretendemos também conhecer o homem em sua história, em sociedade e as suas esperanças de felicidade.
Postado por DAVID LIMA 1975

RACIONALISMO E TEOLOGIA

Desde as revoluções de caráter social, ideológicas ou cientificas ocorridas na Europa em movimentos como a renascença e o iluminismo, sabe-se que o mundo passou por diversas transformações. A religião passa a não ser a monopolista da verdade, as ciências são valorizadas ao extremo e naturalmente o conhecimento, como formas mais seguras e indubitáveis de representação da verdade objetiva ou mesmo subjetiva, com o uso da razão.
As influências dessas mudanças de postura diante do conhecimento se aplicariam a todos os campos do saber: nas ciências da natureza, exatas e humanidades. Anteriormente em um outro texto comentamos a diversidade, a heterodoxia no pensamento dos teólogos que representam a cristandade com suas diferentes abordagens teológicas que formam uma verdadeira “torre de babel” de concepções o que gera nos leigos imensas dúvidas. Quando se diz a alguém, que estudou teologia, a primeira pergunta que fazem é: “Você acredita em Deus?” Ou fazem suas afirmações: “Aqueles que estudam ou estudaram teologia não acreditam em Deus, abandonam a fé”.
A questão aqui tratada não é exatamente o ter ou não ter fé nesse ou naquele, embora deva reconhecer que há uma ligação entre o que se acredita com as indagações ou afirmações como as que acima foram mencionadas. A chamada alta critica, influenciada pelo racionalismo tem ao longo dos últimos dois ou três séculos feito afirmações que são no mínimo pouco ortodoxas diante das tradições cristãs. Dentro da teologia cristã ela se aplica à literatura vetero-testamentária e também ao estudo neo-testamentário. Segundo o posicionamento desses intérpretes, os livros que fundamentam as crenças judaicas e cristãs são compilações bem posteriores ao que a tradição atribui, isto é, os sugeridos autores tradicionais não são seus autores, a bíblia não é a palavra de Deus, mas, contém a palavra de Deus, em outras palavras, em meio aquilo que se acredita ser divino está um simples relato humano com pretensões ideológicas, o atendimento de determinados interesses. Um exemplo de que trata essa questão, por exemplo, é a defesa da idéia de que Moisés não foi o autor dos cinco primeiros livros do Antigo Testamento (Pentateuco) como a tradição costuma atribuir.
Bem, onde está contida a idéia de racionalismo nessas questões? No simples fato de que a literatura bíblica, para apresentar realmente aquilo que pode ser considerado palavra divina ou apenas humana, deve ser submetida a rigorosos métodos critico-históricos onde a razão exclusivamente dará a precisa resposta. Essa prática iria mais tarde resultar no liberalismo teológico entre os séculos XIX e XX, movimento que desejava adaptar a religião ao pensamento e à cultura moderna. O liberalismo teológico foi rejeitado pela neo-ortodoxia que procurou manter algumas bases da teologia tradicional patristica e da reforma (no caso do protestantismo) embora tenha mantido em certo grau a critica do iluminismo à ortodoxia.
Permanecem até hoje as disputas entre os adeptos de todos esses tipos de pensamento no mundo e no Brasil. As escolas de teologia (faculdades e seminários) se enquadram em alguma área de pensamento, de interpretação, sustentam um ou outro ponto de vista sobre como a teologia deve se encaminhar. As denominações religiosas cristãs podem ser fechadas teologicamente ou permissivas quanto às diferentes formas de interpretação. De qualquer modo, se considerarmos o fato de que estamos lidando com uma área humana de conhecimento, é bastante complexo em teologia uma definição do que é o certo ou o errado no conjunto dessas denominações uma vez que o subjetivismo impera no seu absolutismo.
Postado por DAVID LIMA 1975

DESABAFO DE UM PROFESSOR DE TEOLOGIA

Desabafo de um professor de Teologia
Sou um professor de Teologia em crise. Não com minha fé ou com minhas convicções, mas com a dificuldade que eu e outros colegas enfrentamos nos últimos anos diante dos novos seminaristas enviados para as faculdades de teologia evangélica. Tenho trabalhado como Professor em Seminários Evangélicos presbiterianos, batistas, da Assembléia de Deus e interdenominacionai s desde 1991 e, tristemente, observo que nunca houve safras tão fracas de vocacionados como nos últimos três anos.
No início de meu ministério docente, recordo-me que os alunos chegavam aos seminários bastante preparados biblicamente, com uma visão teológica razoavelmente ampla, com conhecimentos mínimos de história do cristianismo e com uma sede intelectual muito grande por penetrar no fascinante mundo da teologia cristã. Ultimamente, porém, aqueles que se matriculam em Seminários refletem a pobreza e mediocridade teológica que tomaram conta de nossas igrejas evangélicas.

Sempre pergunto aos calouros a respeito de suas convicções em relação ao chamado e à vocação. Pois outro dia, um calouro saiu-se com a brilhante resposta: "não passei em nenhum vestibular e comecei a sentir que Deus impedira meu acesso à universidade a fim de que eu me dedicasse ao ministério". Trata-se do mais típico caso de "certeza da vocação" adquirida na ignorância.

E, invariavelmente, esses são os alunos que mais transpiram preguiça intelectual.

A grande maioria dos novos vocacionados chega aos Seminários influenciada pelos modismos que grassam no mundo evangélico. Alguns se autodenominam "levitas". Outros, dizem que estão ali porque são vocacionados a serem "apóstolos".

Ultimamente qualquer pessoa que canta ou toca algum instrumento na igreja, se auto-denomina "levita". Tento fazê-los compreender que os levitas, na antiga aliança, não apenas cantavam e tocavam instrumentos no Templo, como também cuidavam da higiene e limpeza do altar dos sacrifícios (afinal, muito sangue era derramado várias vezes por dia), além de constituírem até mesmo uma espécie de "força policial" para manter a ordem nas celebrações. Porém, hoje em dia, para os "novos levitas" basta saber tocar três acordes e fazer algumas coreografias aeróbicas durante o louvor para se sentirem com autoridade até mesmo para mudar a ordem dos cultos.

Outros há, que se auto-intitulam "apóstolos". Dentro de alguns dias teremos também "anjos", "arcanjos", "querubins" e "serafins". No dia em que inventarem o ministério de "semi-deus" já não precisaremos mais sequer da Bíblia.

Nunca pensei que fosse escrever isso, pois as pessoas que me conhecem geralmente me chamam de "progressista" . Entretanto, ultimamente, ando é muito conservador. Na verdade, "saudosista" ou "nostálgico" seriam expressões melhores.

Tenho saudades de um tempo em que havia um encadeamento lógico nos cultos evangélicos, em que os cânticos e hinos estavam distribuídos equilibradamente na ordem do culto.

Atualmente os chamados "momentos de louvor" mais se assemelham a show ensurdecedores ou de um sentimentalismo meloso.

Pior: sobrepujam em tempo e importância a centralidade da Palavra e da Ceia nas Igrejas Protestantes. Muitas pessoas vão à Igreja muito mais por causa do "louvor" do que para ouvir a Palavra que regenera, orienta e exige de nós obediência. Dias atrás, na semana da Páscoa comentei com um grupo de alunos a respeito da liturgia das "sete palavras da cruz" que seria celebrada em minha Igreja na 6a feira da paixão. Alguns manifestaram desejo de participar. Eu os avisei então que se tratava de uma liturgia que dura, em média, uma hora e meia, durante a qual não é cantado nenhum hino (pelo menos na tradição de minha Igreja - Anglicana), mas onde lemos as Escrituras, oramos e meditamos nas sete palavras pronunciadas por Cristo durante a crucificação. Ao saberem disso, um deles disse: "se não houver música, não há culto".

Creio que, em parte, isso é reflexo da cultura pop, da influência da "Geração MTV", incapaz de perceber que Deus pode ser encontrado também na contemplação, meditação e no silêncio. Percebo também que alguns colegas pastores de outras igrejas freqüentemente manifestam a sensação de sentirem-se tolhidos e pressionados pelos diversos grupos de louvor. O mercado gospel cresceu muito em nosso país e, além de enriquecer os "artistas" e insuflar seus egos, passou a determinar até mesmo a "identidade" das igrejas evangélicas. Houve tempo em que um presbiteriano ou um batista sabiam dar razão de suas crenças.

Atualmente, tudo parece estar se diluindo numa massa disforme. Trata-se da "xuxização" ("todo mundo batendo palma agora... todo mundo tá feliz ? tá feliz!") do mundo evangélico, liderada pelos "levitas" que aprisionam ideologicamente os ministros da Palavra. O apóstolo Paulo dizia que a Palavra não está aprisionada. Mas, em nossos dias, os ministros da Palavra, estão - cativos da cultura gospel.

Tenho a impressão de que isso tudo é, em parte, reflexo de um antigo problema: o relacionamento do mundo evangélico com a cultura chamada "secular". Amedrontados com as muitas opções que o "mundo" oferece, os pais preferem ter os filhos constantemente sob a mira dos olhos aos domingos, ainda que isso implique em modificar a identidade das Igrejas. E os pastores, reféns que são dos dízimos de onde retiram seus salários, rendem-se às conveniências, no estilo dos sacerdotes do Antigo Testamento.

Um aluno disse-me que, no dia em que os evangélicos tomarem o poder no Brasil acabarão com o carnaval, as "folias de rei", os cinemas, bares, danceterias etc. Assusta-me o fato de que o desenvolvimento dessa sub-cultura "gospel" torne o mundo evangélico tão guetizado que, se um dia, realmente os evangélicos tomarem o poder na sociedade, venham a desenvolver uma espécie de "Talibã evangélico". Tal como as estátuas do Buda no Afeganistão, o "Cristo Redentor" estará com os dias contados.

Esses jovens que passam o dia ouvindo rádios gospel e lendo textos de duvidosa qualidade teológica, de repente vêm nos Seminários uma grande oportunidade de ascensão profissional e buscam em massa os seminários. Nunca houve tanta afluência de jovens nos seminários como nos últimos anos.

Em um seminário em que trabalhei (de outra denominação), os colegas diziam que a Igreja, em breve teria problemas, pois o crescimento da Igreja não era proporcional ao número de jovens que todos os anos saíam dos Seminários como bacharéis em teologia, aptos para o exercício do ministério.

A preocupação dos colegas era: onde colocar todos esses novos pastores?

Na minha ingenuidade, sugeri que seria uma grande oportunidade missionária: enviá-los para iniciarem novas comunidades em zonas rurais e na periferia das cidades. Foi então que um colega, bastante sábio, retrucou: "Eles não querem. Recusam-se! Querem as Igrejas grandes, já formadas e estabelecidas, sem problemas financeiros" .

De fato, percebi que alguns realmente se mostravam decepcionados ao saberem que teriam que começar seu ministério em um lugar pequeno, numa comunidade pobre, fazendo cultos nos lares, cantando às vezes "à capella" e sem o apoio dos amplificadores e mesas-de-som.

Na maioria dos Seminários hoje, os alunos sabem o nome de todas as bandas gospel, mas não sabem quem foi Wesley, Lutero ou Calvino.

Talvez até já tenham ouvido falar desses nomes, mas são para eles, como que personagens de um passado sem-importância e sobre o qual não vale a pena ler ou estudar.

Talvez por isso eu e outros colegas professores nos sintamos hoje em dia como que "falando para as paredes". Nem dá gosto mais preparar uma aula decente, pois na maioria das vezes temos sempre que "voltar aos rudimentos da fé" e dar aos vocacionados o leite que não recebem nas Igrejas. Várias vezes me vi tendo que mudar o rumo das aulas preparadas para falar de assuntos que antes discutíamos nas Escolas Dominicais. Não sei se isso acontece em todos os Seminários, mas em muitos lugares, o conteúdo e a profundidade dos temas discutidos pouco difere das aulas que ministrávamos na Escola Dominical para neófitos.

Sei que muitos que lerem esse desabafo, não concordarão em nada com o que eu disse. Mas não é a esses que me dirijo, e sim aos saudosistas como eu, nostálgicos de um tempo em que o cristianismo evangélico no Brasil era realmente referencial de uma religiosidade saudável, equilibrada e madura e em que a Palavra lida e proclamada valia muito mais que o último CD da moda.
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Por Carlos Eduardo Calvani
Coordenador do Centro de Estudos Anglicanos (CEA) em Londrina.